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terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

O Corpo

O começo do indivíduo é dentro de um corpo. Durante nove meses o indivíduo vive dentro do útero, todas as marcas básicas do corpo, e da personalidade são estruturadas dentro da mãe, durante esse período o feto experimenta amor e rejeição é em relação a esses sentimentos intra uterino que o feto terá maior ou menor condições de aproveitamento nutricional e imunológico, o corpo e personalidade permanecem sempre em um limite mesmo ainda enquanto feto (CHEKHOV, 2003).


Fora do ventre o indivíduo dá início à sua individualidade corporal que vai evoluindo até alcançar a consciência de sua personalidade, tornando presentes as sensações e percepções que acontecem unicamente dentro de seu corpo. Com isso corpo e mente se constituem através da pele, da voz, dos músculos, postura, gestos, nervos, sentidos...

Se pararmos para pensar sobre um corpo meramente físico, a personalidade se desenvolve até o limite da extensão que o corpo de cada indivíduo atinge.

No entanto se eu sou meu corpo e meu corpo é a minha personalidade, é fácil perceber a importância da questão corporal na personalidade do homem enquanto cidadão e artista.

A realidade é que corpo e mente se influenciam mutuamente e permanecem em constante interação.

Tanto um corpo mal desenvolvido quanto um corpo bem desenvolvido muscularmente podem se inclinar ou debilitar à vontade da mente.

Toda profissão corre o risco de suas ações ocupacionais, todo trabalhador pode ser afetado por essas ações do seu cotidiano de trabalho, porém o ator que tem o seu corpo como objeto de trabalho, como instrumento de sua ação criativa no palco deve sempre se manter atento para a utilização do seu corpo e mente em perfeita harmonia.

O ator deve ser aquele que entra diretamente em contato com o fenômeno da expressão, percebendo como, quando e por que ela ocorre em si mesmo. Deve aprender a ver-se, a trabalhar seu corpo e partes deste como um artista ao misturar as cores, observando o efeito, preparando um quadro. (AZEVEDO, 2008, p.135)

Existem atores que conseguem de forma monumental sentir seus papéis de maneira perfeita e profunda, mas não são capazes de transmitir ao expectador todo esse sentimento sentido internamente, todos esses pensamentos, essas sensações estão amarradas dentro de seu corpo “mal desenvolvido”. Para esses atores o ensaio e as apresentações tornam-se angustiantes e dolorosos. A verdade é que todo ator sofre de alguma resistência corporal, seja ela maior ou menor, os exercícios físicos são necessários, porém esses exercícios devem seguir diferentes modos do que usam a maioria dos atores, exercícios circenses, luta, dança, acrobacias, tudo isto é muito importante, porém o ator necessita de requisitos particulares de sua profissão.

Em primeiro lugar o corpo do ator acima de tudo precisa permitir alcançar a sensibilidade para os impulsos criativos, e isso não se consegue através de exercícios puramente físicos. A psicologia deve passar a tomar conta do corpo-realidade por inteiro e seu corpo-ficção deve ser impregnado no todo de forma que se crie uma espécie de campo magnético capaz de contrair e conduzir imagens, sentimentos, emoções com toda sua sutileza. É a união de dois corpos com a mesma concretude.

“Por isso é que jamais o corpo em si deverá ser nosso objeto de estudo e nem objetivo de um labor específico com atores. O que se trabalha é uma totalidade que pensa, sente, age; que é pensada, sentida, agida no fenômeno da interpretação.” (AZEVEDO, 2008, p.135)

Nos dias de hoje, tanto a arte como a vida cotidiana vão sendo direcionadas para caminhos meramente sem valores, parece-nos que apenas o que se é palpável e belo é o necessário. O artista acaba sendo, junto com um todo, seduzido e conduzido a conceitos materialistas sobre todas estas fortes influências materialistas. O artista contemporâneo passa a se envolver numa prática perigosa que é a de eliminar os elementos psicológicos de sua arte, e cada vez mais passa a exaltar o externo (o físico, o belo).

Assim, cada vez que se aprofunda neste universo não artístico o seu corpo também se torna mais artificial, mecânico e falso, assumindo o automatismo, o ator deixa de sentir e começa a recorrer a truques e formas repetitivas.

Seduzidos por esta forte influência dos dias materialistas que vivemos hoje, os atores correm o risco de pularem a fronteira que deve separar a vida cotidiana da vida do palco e passam a fazer o contrário, levar a vida como ela é para o palco.

Tornam-se fotógrafos triviais, ordinários em vez de artistas.

São perigosamente propensos a esquecer que a verdadeira tarefa do artista criativo não é só copiar a aparência exterior da vida, mas interpretar a vida em todas as suas facetas e em toda a sua profundidade, mostrar o que está por trás dos fenômenos da vida, deixar que o expectador olhe mais além da superfície e dos significados da vida. (CHEKHOV, 2003, p.3)


Segundo Michael Chekhov o artista é dotado da capacidade de ver e vivenciar tudo aquilo que é obscuro aos olhos das pessoas comuns, ele é capaz de mostrar, transmitir ao expectador suas impressões pessoais das coisas como ele as vê e sente. No entanto, como será capaz o ator de fazer tudo isso se manter um corpo amarrado e limitado em sua força expressiva?

A forma materialista consumidora do homem sufoca e limita os impulsos imaginários. O ator deve aprender a se manter distante de todas essas formas que tendem a amarrá-lo, e procurar alimentar o seu corpo por impulsos artísticos capazes de transformá-lo de dentro para fora.

O ator que se tornar senhor absoluto de si mesmo e de seu ofício banirá o elemento de “acidente” de sua profissão e criará uma base sólida para seu talento. Somente um comando indiscutível de seu corpo e de sua psicologia lhe dará a alta confiança, a liberdade e a harmonia necessária a sua criatividade. (CHEKHOV, 2003, p.5).

O ator deve ser capaz de vivenciar toda uma história afetiva presente em seus músculos e só assim conseguirá conscientemente alcançar a transparência exigida no trabalho de construção do seu personagem e somente quando estiver realmente preparado para a entrega de si próprio ao momento em que se formam no espaço os seus gestos, é que alcançará sem ansiedade, fazer com que a máscara possa em perfeita harmonia, conviver com todo o universo da cena e seu ritmo

A metamorfose é o caminho do treinamento do ator, ao focar no movimento e conseguir de maneira igualitária lidar com sua energia, o seu corpo passará a dispor constantemente de respostas das quais o ator procura para o seu trabalho. É um processo onde se leva ao auto-confronto e ao auto-conhecimento que leva a tornar o invisível visível ao plano estético.

Alcançar limites e tentar ultapassa-los, esse é um trabalho, é um trabalho físico, a partir do eu físico. Sem as manifestações somáticas, o mundo oculto permaneceria assim inacessível, sem a possibilidade de transformar-se, também ele em ferramenta de trabalho. Trata-se de surpreender coisas que ocorrem no ser do ator (a revelia dele ou encaminhadas por ele) sobretudo de torná-las visíveis. (AZEVEDO, 2003, p.136)

Essas respostas do corpo inteiro sem preconceito é fundamental. Para que isso seja possível de se vivenciar é preciso eliminar a máscara usual e cotidiana pelo menos no momento do trabalho. Só assim transparecerá. É um exercício muito difícil e doloroso, já que no ambiente social a regra é a da aparência onde o que prevalece é o disfarce. Mas no teatro o ator necessita se exercitar arduamente para alcançar a transparência que é mais que fundamental, é vida que deve ser mostrada de forma sentida verdadeira, é vida mais que vivida, é vida construída arquitetada.

Inúmeros exercícios são executados com o objetivo de tornar limpos e verdadeiros os gestos do ator, o seu corpo por inteiro, só que poucos resultados são alcançados. A verdade é que nada adianta começar um trabalho de corpo em improvisações com a busca de libertar tensões acumuladas ao longo do tempo. Alguns estudos mostram que muitas dessas tensões foram acumuladas ao longo de nossa história corpórea, e que nossas histórias deixam marcas profundas que na grande parte são inconscientes.

Nada disso se corrige da noite para o dia, é necessário uma reeducação corporal, só que para se educar nessa situação o processo é inverso.

O processo de deseducação é a constatação de que existe um grande numero de marcas enraizadas que terão que ser trocadas por novas ações corporais. Livrar-se de hábitos corporais é difícil e muito doloroso, todo o organismo sofre com essas mudanças, por que mesmo que estas sejam boas o organismo já está acostumado e tende a se apresentar violento sobre esses novos hábitos.

Ir contra esses hábitos é iniciar uma viagem pela nossa infância, por um caminho onde todas as mensagens foram captadas, desde o útero materno.

Para Laban todo movimento em um corpo parte da fluência de distintas partes do corpo, um movimento que se origina do centro do corpo direcionando para as extremidades, braços, pernas, mãos é naturalmente mais fluente e livre do que aqueles que o centro do corpo permanece fixo.

Todos os atores que estão no palco têm a presença física naquele espaço, no entanto a verdade é que por mais que estejam ali, alguns são nitidamente mais presentes que os outros. O movimento na sua forma de deslocamento não é o que causa a intensidade da presença do ator em palco, muitas vezes somos atraídos por um ator em cena que permanece parado num canto sem movimento algum, sem fala, o que será que tanto nos atrai numa ação como esta? O que há é um intenso repertório psicológico do qual aquele ator faz uso estando sempre presente fisicamente e psicologicamente, causando assim o interesse no expectador em descobrir o que pensa e o que sente o personagem, o que sentimos é que o gesto interior é elemento intermediário entre o psicológico e o físico.

O gesto representa movimento ou atitude corporal quase sempre voluntária, controlada pelo indivíduo. No teatro o gesto pode ser produzido sobre a idéia de um significado dependente ou não de uma dramaturgia ou completamente autônomo. O gesto no teatro parte de uma concepção original de perguntas, intervêm na interpretação e na linguagem da apresentação, a forma formal que conhecemos faz do gesto o meio de expressão naturalista comum.

O gesto dentro do teatro deve ser analisado de forma diferente, com outro ponto de vista, o que não devemos deixar de observar é que em todas as suas formas ele é necessário para que encaremos o significado de expressão, por diversas vezes os gestos no teatro deixam de ser apenas traduções dos gestos da vida cotidiana e passam a ser tornar signos pelos quais se identificam manifestações da alma, todo gesto do ator deve passar a ser visto como uma reprodução de signos em vez de serem só sentimentos. Segundo Grotowski, o pensamento e a atitude corporal caminham sempre juntos, não há separação, o gesto é sempre objeto de pesquisa para descoberta de novos signos.

O corpo deve possuir uma relação de atenção dentro-fora durante todo o período da construção da máscara, o mesmo será na máscara-corpo gestual e para todo o universo imagético, onde reside a criação do personagem. A tentativa é a de estabelecer relação entre pensamentos e emoções, emoções e ações físicas e as sensações para impulsos criativos da ação gestual consciente.

É preciso evitar que ocorra a precipitação na tentativa de expor essas ações, para não correr o risco de construir uma visão externa forçada sem verdade. É necessário construir um diálogo invisível entre as situações ocorridas na mente, pois são nessas situações que ocorrem grande quantidade de um certo tipo de energia capaz de concretizar o que é sentido pelo ator.

Essa preparação tanto física quanto psicológica, é fundamental. Em primeiro lugar,o aparelho somático tem de estar ajustado segundo as leis naturais e sob controle o ator,ou seja ,ele deve estar preparado para conhecer suas sensações e as conseqüentes manifestações físicas produzidas por sua sensibilidade de interprete. (AZEVEDO, 2008, p.184)

Assim o ator vai aproximando-se gradativamente do momento em que o gesto nascerá de modo imprevisto como conseqüência de um longo período de exercícios de maturação.

O inverso também pode acontecer no momento em que o invisível está pronto para se tornar visível na máscara corporal, vindo de todo um estímulo de processos provocado a partir de longo período de exercícios pode ser de alguma maneira travado, amarrado por um reflexo interno do próprio ator, impedindo que toda a energia que daria a visibilidade ao invisível fique pressa internamente.

Toda essa reação podemos dizer que é uma conseqüência psicofísica, o que torna impossível que todos os impulsos internos se externalizem em gestos e signos corporais. falta de preparo mente corpo psicofísico torna quase impossível as chances de aparecimento dos signos corporais no corpo do ator.

É este o caminho que o autor tentou estabelecer entre a sua preparação corporal e sua mente, tentando manter está constante união em todos os momentos.

Foi do inusitado, das repetições, brincadeiras que grande maioria dos gestos nasceram e foram se acoplando a toda uma partitura de imagens que eram construídas no momento do jogo teatral.

As partituras gestuais que compõem o espetáculo foi toda desenvolvida por meio de muitas tentativas o que levaram o autor a se comportar em seu meio social de forma distinta das que mantinha antes, o que vemos são as mudanças corporais do ator como conseqüência da criação de um personagem.

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